O analfabeto político
Um em cada seis municípios brasileiros é dominado por eleitores analfabetos ou semi-analfabetos, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Na Paraíba, em 119 municípios, a maioria dos eleitores são analfabetos ou nunca freqüentaram uma sala de aula. Este é o quadro que se apresenta nas eleições do próximo ano.
Preocupante? Claro que é. O ideal é que tivéssemos majoritariamente um eleitorado letrado, melhor preparado para avaliar o contexto político em que vivemos e elegermos representantes que pudessem efetivamente atender os anseios da sociedade. Mas isso é uma questão cultural do nosso povo e de políticas de educação.
Contudo, entendo que analfabetismo não é sinônimo de ignorância. Se o analfabeto tem capacidade natural e jurídica, submetendo-se à responsabilidade civil criminal em diversos setores da vida, sujeito a obrigações cívicas e direitos sociais como o alfabetizado, porque não estaria também apto a escolher seus representantes?
Afinal de contas, votar é um ato de cidadania e quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões. É incabível a generalização de que o voto do analfabeto é desprovido de qualidade. A capacidade intelectual não garante que se forme um senso crítico.
Tanto é assim que Bertolt Brecht em uma de suas reflexões poéticas fez uma celebre afirmação: “O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não vê, não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia política.” Quando alguém alega ignorância política ou se diz “apolítico”, está firmando um atestado de incompetência de cidadania.Tudo o que existe na vida depende de decisões políticas ou sofre interferência delas.
O analfabeto político é aquele que se dizendo decepcionado, lava as mãos, se omite, e fica debitando exclusivamente aos políticos a podridão observada. É, no mínimo, um ato de irresponsabilidade.
Quem critica e não faz nada é tão culpado quanto quem está errado. Essa postura de alienação do processo político alimenta a corrupção. Sabemos que esse desinteresse vem crescendo nos últimos tempos em razão das denúncias de corrupção, abuso de poder, mordomias, politicagem, incapacidade moral e intelectual de boa parte dos que se colocam como representantes do povo, mas isso não implica dizer que devamos nos abster do processo. Pelo contrário, aí aumenta a nossa responsabilidade. Esses que chamamos de analfabetos políticos é que são verdadeiramente os maiores responsáveis por essa degradação circunstancial da política.
Não me preocupo que boa parte dos nossos municípios tenham eleitores iletrados, o que me preocupa é a alienação dos que teoricamente teriam maiores condições de pensar criticamente, buscando compreender e projetar o futuro.
Rui Leitão