Opinião

De cada dez denúncias de assédio moral no Brasil

De acordo com Walcir Previtale, secretário de saúde do trabalhador da Contraf, o assédio moral ocorre, em grande parte, por conta das metas agressivas determinadas pelas instituições bancárias.

“A cobrança é cada vez mais ambiciosa. Se o trabalhador atingiu os objetivos em um mês, no próximo é cobrado para superá-los. Não há limites”, avalia o secretário, que defende a participação de funcionários na elaboração das metas.

A pressão foi um dos motivos que levou Beatriz* a se sentir humilhada. “Era obrigada a fazer hora extra. Quando não podia trabalhar além do horário, falavam que tinha pouco comprometimento e argumentavam que havia muitos profissionais que nem eu disponíveis no mercado de trabalho”, relata.

A bancária foi demitida do banco após queixar-se das humilhações, mas foi afastada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a pedido do médico do trabalho durante o exame demissional.

“No banco, se você recebe duas avaliações negativas, é mandado embora. É uma pressão muito grande”, destaca.

Paralelamente à cobrança por metas, o setor bancário extinguiu 10 mil postos de trabalho em 2013, segundo estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

Thinkstock/Getty Images

Profissionais vítimas de assédio moral podem desenvolver doenças físicas e psiquiátricas

Apesar do enxugamento no quadro de funcionários, o lucro líquido dos bancos cresceu R$ 1 bilhão em relação a 2012, atingindo R$ 60,6 bilhões, informa o Banco Central (BC).

No entanto, em 2013, a relação entre rentabilidade e patrimônio (sigla ROE, no jargão financeiro) dos bancos fechou com 11,97%, queda de 5,06 pontos percentuais em relação a 2012, segundo a consultoria Economatica. Este indicador avalia a rentabilidade das empresas.

“O setor bancário é o único que tem ferramenta de conflito de trabalho na convenção coletiva. Temos um canal onde o trabalhador pode denunciar casos de assédio moral. O banco, ao receber a denúncia, vai retreinar o gestor ou transferí-lo para evitar que esse problema volte a ocorrer”, defende Magnus Apostólico, diretor de Relações do Trabalho da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

Segundo o diretor da entidade, a federação recebeu 42 denúncias em 2011 — quando o canal foi lançado. Em 2012, 119. No ano passado, esse número aumentou para 171 – alta de 43,70% em relação a 2012.

“A alta expressiva se deve à entrada de um grande banco [no acordo] e ao maior acesso dos trabalhadores à ferramenta. Hoje, eles se sentem mais confortáveis em reclamar”, explica.

Na avaliação do diretor da Febraban, as metas não são responsáveis pelo aumento do assédio moral. Isso porque, segundo ele, o índice de rotatividade do setor é baixo.

O que fazer ao setor vítima de assédio moral, em ordem 

1- Converse com o gestor com uma testemunha ao lado

2- Faça uma queixa no canal de denúncias do banco

3- Entre em contato com o sindicato da categoria

4- Denuncie o caso ao Ministério do Trabalho ou ao Ministério Público do Trabalho

5- Entre com ação judicial contra o banco

Fonte: Ministério Público do Trabalho

“O setor bancário é um segmento que roda pouco e mantém as pessoas no trabalho. Nossa rotatividade é de 4,5%”, defende o executivo da Febraban. Pesquisa do Dieese mostra que o índice de rotatividade no País em 2012 (último disponível) está em 64%.

Para Ricardo Carneiro, procurador do Trabalho e gerente nacional do projeto “Assédio é Imoral”, o profissional que sofre assédio moral geralmente teme perder o emprego ao realizar uma denúncia.

Por este motivo, o MPT realizou uma campanha nacional em 2013 com foco no assédio moral dos bancários. O objetivo era que os trabalhadores se sensibilizassem e denunciassem casos de abuso a algum órgão, como o próprio MPT.

“As pessoas estão conhecendo mais o que é assédio moral e, consequentemente, defendendo com mais força os seus direitos”, destaca Carneiro.

Saúde

Casos de assédio moral não agridem apenas a integridade do funcionário, mas também podem causar danos à saúde física e mental do profissional, alerta Maria Maeno, médica da Fundacentro, do Ministério do Trabalho.

Desejo dos bancários

O que os trabalhadores reivindicam ao sindicato, por ano, em %

Fonte: Contraf

 

“As vítimas de humilhação podem ter desde mal estar e depressão, até problemas gástricos, hipertensão e anorexia. O tratamento deve ser feito com psiquiatra, medicamentos e psicólogo, e pode levar anos”, aconselha a médica.

Olhar para o trabalho de forma negativa é o primeiro sinal de que algo não está certo, afirma Maria. “A tendência de quem sofre assédio moral é ter repulsa ao trabalho. Não querer se imaginar mais dentro da empresa.”

A bancária Lúcia*, de 36 anos, trabalha em um grande banco brasileiro há 15 anos. Nos últimos três, começou a sentir dores de cabeça, ter crises do pânico e ter pensamentos suicidas. O dianóstico é depressão.

“Fui afastada algumas vezes pelo INSS. Em uma delas, quando voltei a trabalhar, me colocaram para editar tabelas durante dois meses, o que não é o meu trabalho. Disseram que estavam me fazendo um favor por eu estar empregada”, relata a operadora de atendimento.

Indignada com a situação, a bancária — que ainda está empregada — entrou com processo contra o banco em 2011 e ganhou em primeira instância. O caso, contudo, ainda corre na Justiça, uma vez que a instituição financeira recorreu.

“Não pedi demissão porque meu marido não é registrado e tenho um filho de quatro anos. Preciso do plano de saúde e do dinheiro para comer. Fiquei traumatizada e não tenho mais condições de voltar ao mercado de trabalho por conta disso”, diz.

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